Mercado sobre emoções
O avanço das tecnologias digitais tem exposto um dado alarmante: uma em cada dez crianças e adolescentes no Brasil já recorreu a ferramentas de inteligência artificial generativa para desabafar sobre emoções ou buscar conselhos pessoais.
Por Julia Portela
O avanço das tecnologias digitais tem exposto um dado alarmante: uma em cada dez crianças e adolescentes no Brasil já recorreu a ferramentas de inteligência artificial generativa para desabafar sobre emoções ou buscar conselhos pessoais. A informação é da pesquisa TIC Kids Online Brasil, do Cetic.br, divulgada nesta quarta-feira (22/10), que ouviu 2.370 jovens de 9 a 17 anos e seus responsáveis, entre março e setembro de 2025.
Entre adolescentes de 15 a 17 anos, 16% afirmaram ter utilizado algum tipo de IA para falar de sentimentos ou problemas pessoais. Entre os de 13 a 14 anos, o índice chega a 12%. Os números revelam uma relação preocupante de dependência emocional com sistemas digitais, que transformam a solidão e a vulnerabilidade da juventude em mais um nicho de lucro para as grandes corporações de tecnologia.
A tendência de humanizar robôs e delegar funções de escuta e acolhimento emocional não é um avanço, mas um reflexo da desumanização imposta por um modelo de sociedade voltado ao consumo e ao lucro. O mesmo sistema que precariza as relações humanas e destrói vínculos comunitários agora oferece máquinas como substitutas da convivência real.
A romantização da inteligência artificial e o fascínio pelas tecnologias no cotidiano aprofundam o isolamento, principalmente entre jovens. Em vez de promover consciência crítica e interação social, as plataformas digitais criam bolhas de pensamento e reforçam comportamentos automatizados, moldando uma geração cada vez mais distante da empatia e da coletividade.
Em um mundo dominado por corporações que lucram com dados e emoções, defender a presença humana, a escuta e o diálogo é um ato político. Valorizar a educação, a convivência e o cuidado coletivo é essencial para resistir à lógica fria do mercado e recolocar a humanidade no centro da vida.
