“A democracia só se sustenta pelas massas”
O economista Caio Marcos Botelho Ferreira, 38 anos, estudioso da comunicação popular, secretário de Movimentos Sociais do PCdoB-BA e diretor do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz).
Potencializar a comunicação popular na afirmação de um projeto de Brasil que efetivamente garanta a soberania nacional, reduza as desigualdades, combata a pobreza, assegure justiça às camadas mais vulneráveis da população, enfim promova a cidadania, principalmente para os pobres e pretos residentes nas periferias.
Estes foram alguns dos temas marcantes do Encontro de Mídias Periféricas, realizado dia 18 passado, no Sindicato dos Bancários da Bahia, e que teve como um dos organizadores o economista Caio Marcos Botelho Ferreira, 38 anos, estudioso da comunicação popular, secretário de Movimentos Sociais do PCdoB-BA e diretor do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz).
Em entrevista exclusiva para O Bancário, Caio Botelho afirmou que “a democracia só é real quando sustentada pela participação ativa das massas” e previu a reeleição de Lula na eleição do próximo ano.
Rogaciano Medeiros
O Bancário - Como você avalia os movimentos sociais no Brasil em uma conjuntura marcada por assédio da extrema direita fascinazista?
Caio Botelho - Os movimentos sociais cumprem um papel decisivo na resistência democrática diante do avanço da extrema direita de caráter neofascista. Foram eles que ajudaram a conter as ameaças golpistas e a sustentar a vitória de Lula em 2022. Ainda que enfrentem dificuldades, perseguições e campanhas de deslegitimação, seguem como espaço fundamental de organização popular e de luta por direitos. Nos últimos anos experimentamos um período de refluxo nas lutas de massas - parte natural da dinâmica histórica - e a retomada não virá por decreto, e sim como fruto de um trabalho político consistente, de longo prazo, consciente e unitário. As últimas manifestações provaram que isso é possível. De outro lado, a extrema direita tenta criminalizar a ação coletiva, mas cada vez que o povo se mobiliza demonstra que a democracia só é real quando sustentada pela participação ativa das massas.
O Bancário - É possível afirmar que as esquerdas estejam recuperando as bases populares perdidas para as igrejas evangélicas?
Caio - Em primeiro lugar, devemos sempre cultivar genuíno respeito à religiosidade do povo e seu direito a manifestar livremente sua fé. Justamente por isso nos indignamos quando essa fé honesta, sobretudo de pessoas pobres, é explorada por charlatões que buscam vantagens em benefício próprio - são verdadeiros "vendilhões do tempo" da Era moderna. Ao longo dos últimos anos houve, de fato, um deslocamento de setores populares que antes estavam mais ligados à militância política e sindical. Mas a esquerda, com Lula novamente na Presidência, começa a reconstruir vínculos ao dialogar sobre as condições concretas de vida do povo: emprego, salário, saúde, educação, moradia... Esse reencontro passa pela presença solidária nas comunidades e pelo respeito à fé, sem abrir mão da luta por um Brasil mais justo. É um processo lento, que demanda tempo, mas plenamente realizável.
O Bancário - Como o resgate do projeto de democracia social a partir da vitória de Lula nas urnas em 2022 tem conseguido fortalecer os movimentos sociais?
Caio - Vamos recuperar a confiança do povo na medida em que mostramos que, através da luta, é possível avançar na conquista de direitos e melhores condições de vida. A eleição de Lula representou a retomada da esperança. Seu governo abriu espaço para que os movimentos sociais fossem novamente ouvidos e participassem de conselhos, conferências e políticas públicas. Programas como o Bolsa Família, o reajuste do salário mínimo e a valorização dos serviços públicos criam melhores condições para a mobilização popular. Há ainda muito a avançar, mas a reconstrução democrática devolve legitimidade e confiança às lutas sociais. E os movimentos sociais têm o desafio de apresentar ao povo essas conquistas e demonstrar que elas não foram fruto do acaso.
O Bancário - As robustas manifestações do dia 21 de setembro, em todo o país, podem ser consideradas como a retomada da mobilização popular perdida, a volta do povo às ruas?
Caio - Sem dúvida. Mesmo antes, no dia 1º de agosto, foram realizadas manifestações que tiveram tamanho considerável. E os atos de 21 de setembro, em Salvador e em todo o Brasil, foram uma demonstração inequívoca de que o povo está disposto a defender a democracia, atacadas por propostas como a PEC da bandidagem e a anistia aos golpistas. É um sinal de que, com unidade, organização e clareza de objetivos, podemos reocupar as ruas como espaço de disputa política. Essa retomada é um passo fundamental para consolidar vitórias estratégicas em defesa da soberania nacional e da justiça social.
O Bancário - Você foi um dos organizadores do Encontro de Mídias Periféricas, ocorrido dia 18 de setembro, no Sindicato dos Bancários da Bahia. Como relacioná-las, para o bem e para o mal, com as big techs?
Caio - Esse Encontro faz parte do Território Mídias Brasil, que é um projeto audacioso que pretende reunir centenas de mídias de território para a troca de experiências e fortalecimento coletivo. As mídias periféricas são expressão criativa e popular da comunicação. Elas dão voz a quem historicamente foi silenciado. Contudo, seu alcance depende, em grande medida, das plataformas digitais controladas pelas big techs, que têm interesses comerciais e políticos próprios. Isso cria uma relação ambígua: de um lado, abre oportunidades de difusão; de outro, impõe limites e censuras veladas. O desafio é fortalecer as mídias comunitárias e populares, ampliando sua autonomia e democratizando de verdade a comunicação.
O Bancário - Como os movimentos sociais podem ajudar na reeleição de Lula no próximo ano?
Caio - A reeleição de Lula será garantida pela combinação de resultados concretos do governo com a mobilização popular. Os movimentos sociais precisam ser protagonistas na explicação das conquistas alcançadas, na denúncia das manobras da extrema-direita e na apresentação de um horizonte de futuro. Mais que pedir votos, trata-se de enraizar no povo a convicção de que somente com um projeto democrático e popular é possível enfrentar a desigualdade, gerar empregos e defender a soberania nacional.