Violência doméstica não é acaso

A insegurança se impõe dentro de casa, no transporte, nas ruas e até nos serviços que deveriam acolher. Quando não existe política pública sólida, a sobrevivência vira responsabilidade individual, e isso aprofunda ainda mais o abismo. A entrada no mercado surge como caminho real de emancipação, porque garante renda, e escolhas. 

Por Camilly Oliveira

A violência contra mulheres é uma construção histórica que atravessa séculos. A nova Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher expõe um recorde desta ferida: entre as 21.641 entrevistadas, 69% das que sofreram agressões tiveram a rotina rompida, impacto que atinge cerca de 24 milhões de brasileiras. As consequências são várias: 68% relataram danos nas relações sociais, 46% tiveram o trabalho comprometido e 42% perderam o ritmo dos estudos. 

 


O dado central da pesquisa é assustador: mulheres fora do mercado têm três vezes mais risco de sofrer violência, 12% contra 4% entre as que exercem trabalho remunerado. A desigualdade também aparece nos bolsos: 66% das agredidas vivem com até dois salários mínimos, mostrando como dependência econômica e vulnerabilidade se entrelaçam para manter uma parcela enorme da população sob controle. 

 


A insegurança se impõe dentro de casa, no transporte, nas ruas e até nos serviços que deveriam acolher. Quando não existe política pública sólida, a sobrevivência vira responsabilidade individual, e isso aprofunda ainda mais o abismo. A entrada no mercado surge como caminho real de emancipação, porque garante renda, e escolhas. 

 


Criada em 2005 para subsidiar a Lei Maria da Penha, a pesquisa mostra que enfrentar a violência exige articulação entre segurança, saúde, educação, assistência e renda. O Brasil não pode continuar normalizando que milhões tenham a vida interrompida por agressões.