Nova servidão com mesmo sofrimento
O discurso da flexibilidade serve apenas para encobrir uma lógica cruel: transferir ao trabalhador todos os riscos e custos, enquanto as plataformas ampliam lucros.
Por Julia Portela
Os números escancaram a face mais perversa do mercado de trabalho brasileiro: o avanço da precarização. O total de pessoas que trabalham por meio de aplicativos cresceu 25,4% ano passado, em comparação com 2022. No período, o contingente passou de 1,3 milhão para quase 1,7 milhão de trabalhadores, um aumento de 335 mil pessoas empurradas para a informalidade, muitas vezes por falta de alternativa.
Os dados do IBGE revelam a consolidação de um modelo de exploração disfarçado de “autonomia”. Os chamados "plataformizados" compram a promessa de liberdade, mas recebem jornadas exaustivas, rendimentos instáveis e ausência total de direitos. O discurso da flexibilidade serve apenas para encobrir uma lógica cruel: transferir ao trabalhador todos os riscos e custos, enquanto as plataformas ampliam lucros.
Sem garantias, sem proteção e submetidos a taxas abusivas dos aplicativos, esses trabalhadores vivem o oposto do que foi prometido. A falsa ideia de “empreendedorismo” se transforma em uma nova forma de servidão moderna, onde cada corrida, entrega ou serviço executado representa mais desgaste e menos dignidade.
A informalidade crescente não é fruto de escolha, mas de um sistema que empurra o povo para sobreviver sem direitos. A resposta precisa vir por meio de regulamentação justa e de valorização das relações formais de trabalho, que assegurem condições dignas e proteção social.
Precarizar não é modernizar. É repetir, com nova roupagem, a velha exploração que mantém o trabalhador na base da pirâmide e o capital cada vez mais concentrado no topo.